Uma parcela da Medida Provisória nº 1.171 de 30 de abril de 2023 (“MP”) vem a alterar as regras aplicáveis aos investimentos e ativos detidos no exterior por residentes no Brasil.
Por ser uma MP, os efeitos da medida podem durar até 120 dias caso ela não venha a ser convertida em lei em pelo Congresso. Em razão disso, a maioria desses investimentos apenas será afetada em 2024 se o texto da MP for convertido em lei na forma como ele encontra-se atualmente.
Na sequência, serão abordados os pontos em destaque na MP. Para maiores informações, estaremos disponíveis nos nossos canais de comunicação.
Investimentos detidos diretamente por pessoa física
Nessa modalidade de investimento – que engloba aplicações financeiras e recebimento de dividendos de entidades no exterior, por exemplo –, a MP introduziu a incidência do IRPF anual sobre os rendimentos oriundos desses investimentos.
Consequentemente, os contribuintes deverão informar, dentro das suas declarações anuais, os rendimentos auferidos anualmente através de investimentos no exterior, sujeitando-se às seguintes alíquotas:
- 0% sobre a parcela dos rendimentos que não ultrapassar R$ 6.000;
- 15% sobre a parcela dos rendimentos que exceder R$ 6.000 e não ultrapassar R$ 50.000; e
- 22,5% sobre a parcela dos rendimentos que for superior a R$ 50.000.
Vale ressaltar que essas alíquotas serão aplicadas de forma progressiva. Ou seja, apenas a parcela de R$ 4.000 será tributada a 15% dentro de rendimentos anuais que totalizarem R$ 10.000, por exemplo.
Em relação aos investimentos que forem resgatados durante um ano-calendário, o contribuinte deverá recolher o IRPF sobre os seus rendimentos no mês seguinte em que eles forem resgatados. As regras permaneceriam inalteradas, no entanto, no resgate de bens no exterior que não constituam uma aplicação financeira (como um imóvel, por exemplo).
Adicionalmente, a variação cambial nos investimentos também será considerada como rendimento gerado pelos investimentos mantidos no exterior.
Investimentos detidos através de entidade estrangeira
Uma das alterações de maior destaque trazidas pela MP é a tributação, em 31 de dezembro de cada ano, dos lucros apurados em entidades localizadas no exterior que sejam controladas por pessoas físicas residentes no Brasil. Para esse fim, as alíquotas aplicáveis sobre a tributação dessas entidades são iguais às cabíveis sobre as pessoas físicas que detenham investimentos no exterior.
No viés da MP, uma entidade estrangeira será considerada como controlada por uma pessoa física residente no Brasil se esta:
- Detiver, de forma direta ou indireta, a preponderância sobre as deliberações da entidade ou o poder de alterar o corpo diretivo dessa entidade; ou
- Possuir, direta ou indiretamente, mais de 50% do capital social, dos direitos à percepção dos lucros da entidade ou recebimento de ativos quando liquidada. Nessa hipótese, a porcentagem poderá ser determinada em conjunto caso o investidor detenha participações ou direitos em conjunto com outros membros do seu núcleo familiar ou outras pessoas físicas e/ou jurídicas que estejam relacionadas a participações em entidades brasileiras.
Além disso, apenas se sujeitam à cobrança do IRPF as entidades que (i) se encontrem em jurisdições com tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado ou (ii) apurem uma renda passiva anual superior a 20%.
Por fim, a MP também prevê a incidência das alíquotas do IRPF quando houver a disponibilização de lucros por entidade controlada no exterior que não estejam elencadas dentro das hipóteses trazidas no parágrafo anterior.
Assim como aplicável às pessoas físicas, entrará no cálculo dos rendimentos obtidos pela entidade controlada no exterior a variação cambial desde a aquisição dos ativos até o momento em que eles forem apurados.
Investimentos detidos em um Trust
Outro ponto abordado pela MP é a definição quanto à natureza dos bens e rendimentos detidos no exterior através de um Trust.
Maiores informações sobre os Trusts poderão ser encontradas aqui.
Na ótica da MP, o instituidor (“settlor”) do Trust é considerado, para fins tributários, como sendo o titular do patrimônio detido pelo instrumento, independentemente se revogável, discricionário ou não. Essa titularidade seria transferida aos beneficiários no momento da distribuição desse patrimônio, seja em vida, ou não, do instituidor.
Como consequência, todos os rendimentos auferidos pelo patrimônio de um Trust estarão sujeitos à incidência do IRPF segundo as regras aplicáveis ao seu titular. Adicionalmente, todas as transferências patrimoniais ocorridas em um Trust serão consideradas como uma doação gratuita do doador ao beneficiário.
Além disso, a MP passou a considerar o Trust como uma entidade transparente para fins fiscais. Assim, o titular desse instrumento deverá declarar separadamente na sua DIRPF todos os investimentos mantidos pelo Trust e, consequentemente, recolher os impostos devidos na apuração dos rendimentos gerados por esses investimentos.
Possibilidade de atualização a valor de mercado
Paralelamente às alterações, a MP possibilitou que os contribuintes possam auferir de uma alíquota reduzida sobre a atualização dos valores desses mesmos investimentos.
Dessa forma, as pessoas físicas afetadas pela MP poderão atualizar o valor desses investimentos nas suas DIRPFs com base no valor de mercado em 31 de dezembro de 2022. Desse modo, elas recolherão tributos sujeitos à alíquota de 10% sobre a diferença entre o custo histórico de aquisição e o valor de mercado informado, devendo eles serem pagos até 30 de novembro de 2023.
Para as entidades estrangeiras controladas, no entanto, será possível realizar uma atualização separada com base no valor de mercado entre 1º de janeiro de 2023 a 31 de dezembro de 2023, devendo o imposto ser pago até 31 de maio de 2024.
Considerações práticas
Os contribuintes brasileiros podem ponderar se ainda seria vantajoso manter investimentos através de entidades estrangeiras diante das alterações trazidas pela MP. Mesmo que ela venha a ser transformada em lei, ainda é possível encontrar mais fatores favoráveis a manter investimentos por intermédio de uma entidade no exterior.
São condições que indicam um melhor cenário para estruturação de investimentos através de uma entidade estrangeira:
- IOF sobre remessa de capital – sendo a alíquota para remessas em entidades estrangeiras de 0,38% em comparação com 1,1% aplicável a pessoas físicas;
- Possibilidade de diferimento – com a MP, ainda é possível aproveitar-se do diferimento tributário, devendo os impostos sobre os rendimentos serem recolhidos apenas ao final do ano, independentemente de terem sido recolhidos anteriormente ao longo do ano. Em contraste, as pessoas físicas deverão recolher os impostos sobre rendimentos a partir do momento que eles forem realizados;
- Dedução de despesas – no cálculo de rendimentos ao final do ano, é possível deduzir despesas ocorridas durante o ano-calendário e tributos pagos no exterior (podendo serem cumuladas as despesas ocorridas em subsidiárias). Além disso, os lucros e dividendos originados de subsidiárias localizadas no Brasil também poderão ser utilizados nessa dedução;
- Planejamento sucessório e patrimonial – as entidades estrangeiras não buscam oferecer apenas proveitos de ordem tributária, mas sim, oferecer a oportunidade de diversificação do patrimônio do investidor cumulado ao planejamento sucessório dele. Nessa ótica, essas entidades possibilitam que o patrimônio do investidor no exterior seja transferido mais efetivamente aos seus herdeiros, podendo essa transferência ocorrer de forma personalizada levando-se em consideração as particularidades do investidor e do seu núcleo familiar.
Além disso, a contabilidade anual das entidades estrangeiras também adquire uma importância primordial nos investidores que optam por investir por intermédio delas. Nesse aspecto, é relevante que a contabilidade dessas entidades siga os padrões internacionais de contabilidade de modo a atender tanto as exigências das autoridades do país de residência do investidor quanto das da jurisdição onde a entidade está localizada.
Igualmente, é recomendável o preparo da documentação contábil em formato bilíngue para garantir uma maior acessibilidade por parte das autoridades em ambas as jurisdições.
Fonte: Palácio do Planalto
Publicado em 03 de maio de 2023